segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O HOMEM QUE VIVEU COM OS LIVROS, O ROMANCE QUE ELES LHE CONTAVAM



"Os livros têm os mesmos inimigos que os homens : o fogo, a umidade, os animais, o tempo e o próprio conteúdo" - Paul Valery




Não poderia deixar de citar neste espaço, a profunda admiração que eu e qualquer aficionado por livros tem por José Mindlin, este brasileiro que fez de sua própria vida uma obra de arte.  Tive o enorme prazer de assistir a inúmeras entrevistas que concedeu, do alto de seus mais de 90 anos  excepcionalmente bem vividos, que refletiam seu caráter apaixonado, sereno, de uma cultura inigualável nos padrões contemporâneos e mesmo assim, de uma humildade que deveria fazer corar nossa pseudo-intelectualidade acadêmica urdida há décadas nas águas mortas do determinismo histórico e da luta de classes. A história desse homem e seu amor pelos livros e pela cultura não apenas gerou um exemplo inspirador, como deixou um legado aos brasileiros de valor inestimável : sua imensa biblioteca particular, uma das maiores e mais valiosas do mundo, que foi integralmente doada à USP, pouco antes de sua morte. Nunca vi ou ouvi uma manifestação do corpo discente sobre este prêmio recebido há poucos anos, fruto do investimento de uma vida inteira dedicada à cultura e ao conhecimento. Embora a Edusp, junto com a Companhia das Letras tenham editado um belíssimo volume – “Uma vida entre Livros – Reencontros com o Tempo”, a repercussão deste fato foi infinitamente menor na mídia do que qualquer entrevero entre polícia e invasores de reitoria ou de espaços públicos. José Mindlin legou-nos ainda uma bibliografia dedicada ao seu amor pelos livros e sua peregrinação pelo mundo, em busca de volumes raros, primeiras edições, registros e documentos raros que ajudam a resgatar e organizar a história da literatura nacional e consequentemente, parte da história da humanidade. Suas histórias são deliciosas, profundamente humanas e por vezes hilárias, como da vez em que sua casa foi assaltada por um bandido que usou para coagi-lo a lhe dar um resgate, nada mais do que uma caixa de fósforos com a qual ameaçava atear fogo aos seus preciosos livros. Há ainda relatos das “perseguições” que teve que empreender pelo mundo atrás de determinado livro ou documento, os sebos, os leilões. O maior exemplo no entanto, não vem exclusivamente de sua predileção pelo saber, mas de ter feito tudo isso, sem deixar de ser um brilhante advogado, secretário da Cultura, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, constituir uma bela família e ser um dos mais bem sucedidos empresários que o país já teve : construiu nada menos do que a Metal Leve – uma das maiores empresas do setor de autopeças do Brasil. Em épocas em que o maior objetivo do mais badalado empresário brasileiro é ser o mais rico do mundo até 2016 e que a solução para a educação brasileira parece se concentrar exclusivamente no acesso ao ensino oficial, independente da qualidade deste estar abaixo da crítica de qualquer padrão internacional sério, Mindlin nos faz uma imensa falta !  

Recomendo para os que admiram José Mindlin, estas duas pequenas obras primas, riquíssimas em seu conteúdo, que me deram um enorme prazer : “ No Mundo dos Livros” – Editora Agir – 2009 – 103 págs. E “Uma Vida entre Livros – Reencontros com o Tempo “ – Edusp/ Cia. Das Letras – 2008 – 231 págs. 







4 comentários:

  1. Mandou bem Eliseu.
    Sincera e justissima homenagem a ele !

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  2. É... a gente precisava de uns tantos empresários deste tipo e podíamos exportar os Eikes pra China !

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  3. Você se lembra da sua primeira cartinha? Qual o nome? Me lembro da minha dos anos 30/40 e se chamava "CARTILHA SODRÉ".Nunca esqueci essa cartilha que começei a ler aos cinco anos e meio. Decifrar as letras me encantava! Tinha um texto sobre a árvore que dizia: A Árvore......."A árvore nos dá a sombra, as folhas, os frutos, a madeira....etc....etc.
    Poder ler foi uma das grandes invenções do ser humano! Sua devoção à leitura é invejável.

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  4. Minha primeira cartilha foi a "Caminho Suave" e não obstante as críticas pedagógicas que recebeu posteriormente, sou muito grato à ela e a quem a elaborou. E concordo : a escrita foi uma das maiores invenções do ser humano e o hábito da leitura é a possibilidade de ampliar a experiência e aproveitar o que nossos antepassados e contemporâneos experimentaram e pensaram ao longo de sua existência.

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