sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

OS LIVROS



Os livros salvaram minha vida ! 

Talvez por solidão ou falta de coisas mais interessantes para fazer, aproximei-me muito cedo da leitura : livros de histórias “inocentes”, fábulas, contos de Grimm e alguns poucos gibis foram minhas primeiras leituras. Lembro-me de ficar horas lendo e relendo aqueles livrinhos que eram capazes de me trazer muita emoção: cortava-me o coração a história da “Girafinha Faladeira”, que de tanto falar o que não devia e fazer fofocas, foi submetida a uma tortura inimaginável pelos demais “amiguinhos” da floresta : teve sua língua queimada com uma pomada à base de pimenta e ervas ácidas e ficou muda... muda, mas querida pelos demais “amiguinhos”, pois afinal ela havia pago o preço e “aprendido a lição”. Esta história me incomodava de sobremaneira. Provavelmente porque eu tive minha própria língua queimada num fatídico acidente com eletricidade e me identificava com a girafinha. Por outro lado, achava estranho aquela punição, desmedida, brutal. Não entrava em minha cabeça que os animaizinhos da floresta (a coruja, o coelho, a corsa, o jaboti e outros “mimosos”) fossem capazes de cometer um ato destes. Li e reli esta história por diversas vezes, talvez na esperança de que o final se tornasse diferente como num passe de mágica, coisa que obviamente não aconteceu. Fiquei pensando durante muito tempo sobre o que significava “ter aprendido a lição”. Perguntava-me como eles (os demais animaizinhos da floresta) podiam saber se a girafinha havia aprendido a lição se ela não podia mais falar... Levou muito tempo para que eu pudesse compreender a “inocência” que havia por trás de tais histórias. Nestes primeiro anos, um livro em especial me marcou : “Meu pé de Laranja Lima” de José Mauro de Vasconcelos. Reli-o cerca de dez vezes, sempre me emocionando com determinadas passagens da saga de Zezé, o menino protagonista e autor do livro, e sua árvore, seu pé de laranja-lima a quem deu o nome de Minguinho. Mais uma vez o plano de identificação era perfeito : a infância pobre, a incompreensão do mundo adulto e as fantasias que aplacavam a solidão. Seu texto permanece gravado em minha mente até hoje :as irmãs Glória (Godóia) e Jandira, o Portuga, o Mangaratiba, a medalha escrita “Carborundum”...os folhetos “picantes” do Seu Ariovaldo : “Eu quero uma mulher bem nua, Bem nua eu quero ter, De noite no clarão da Lua, eu quero o corpo da mulher “. 





Um pouco mais tarde, tive acesso a uma literatura de qualidade ligeiramente superior  como os clássicos da literatura infanto-juvenil : O Conde de Monte Cristo; As Aventuras de Tom Sawyer (que li cerca de quinze vezes); O Último dos Moicanos; A Ilha do Tesouro; Sem Família; Os Três Mosqueteiros; As Aventuras de Huck Finn; A volta ao Mundo em 80 dias; Vinte mil léguas submarinas;Dom Quixote e outros tantos clássicos. A esta altura, também me interessava pelas enciclopédias e coleções que minha mãe comprava com dificuldade, de forma fasciculada nas bancas de jornal. Lia tudo que me caia às mãos, os contos futuristas de Isaac Asimov e Arthur C. Clarke eram meus prediletos, mas não dispensava a coleção de romances policiais de Ellery Queen que descobri na casa de uma tia. Analisando do ponto de vista atual, penso que a falta de  uma estrutura que orientasse minha curiosidade ou de um ambiente que inspirasse minhas buscas teve, como tudo na vida, aspectos positivos e negativos. O principal aspecto positivo é que, carente de qualquer orientação, parti para uma busca pessoal, onívora mesmo, onde ampliei meu espectro de interesses ao máximo. Fui construindo minha compreensão do mundo através de um autodidatismo que me colocava em estado de prontidão para “ir atrás” daquilo que despertava minha atenção. Talvez o aspecto negativo tenha sido eu ignorar determinadas obras, às quais tive acesso muito mais tarde do que poderia, e que teriam me dado enorme prazer e, porque não dizer, me poupado muito trabalho se eu soubesse que existiam. Hoje a internet é uma fonte praticamente inesgotável de informação, que nos permite acesso a bibliotecas no mundo todo, gratuitamente. Existem ferramentas de busca excepcionais que transformaram o mundo dos curiosos como eu. Ah, como seria bom ter essas ferramentas aos doze anos, no auge de minha curiosidade onívora associada à disponibilidade de tempo ! Mas não me queixo : Os livros salvaram minha mente e minha vida e hoje posso desfrutá-los nos mais diversos formatos - Ao invés de reler Dom Quixote, ouvi a narração completa do livro que tornou muitas horas do trânsito paulistano em puro deleite.
Minha intenção neste Blog é justamente compartilhar essas maravilhosas viagens com outros curiosos...

6 comentários:

  1. Quando eu era criança, os livros eram minha distração. Eu me transportava para dentro deles e fazia viagens inebriantes junto aos personagens.Naquela época não existia internet, a Tv ficava no ar por poucas horas, então era o que de melhor se tinha a fazer para se distrair. Gostar da leitura então se tornou uma coisa natural. Mas quando tentei transmitir isso aos meus filhos, e na minha cabeça isso seria facílimo, tive uma amarga surpresa. Não tenho nem como mensurar o quanto gastei em uma década e meia mais ou menos com a compra de livros infantis, juvenis, e toda sorte de literatura adequada a cada idade, e pra nada! Se eu lesse pra eles, então tudo bem, caso contrário, os livros apenas serviam para enfeitar as prateleiras. E a julgar pelas atrocidades que observamos diariamente no trato com o nosso idioma, me parece que não é um caso isolado, mas sim um problema cultural das novas gerações. Meus filhos lêem sim, mas por pura obrigação jamais por prazer. É realmente curioso...para nossa geração, ter as facilidades de hoje teria sido uma benção, mas a geração de hoje me parece que não vibra muito com isso. Claro que existem excessões, mas com certeza são minoria.

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    1. É mesmo uma pena e penso que dificilmente o hábito da leitura como nós conhecemos, voltará a ter espaço na cabeça das gerações atuais. Aprendemos com leituras mais densas, onde precisávamos percorrer 200 ou 300 páginas de texto para chegarmos ao desfecho de uma história. Este processo é um grande treinamento de atenção concentrada, memória, vocabulário e capacidade de analogia que nos fazia pensar . A internet é uma excelente ferramenta para quem já sabe pensar, pois caso contrário tende à extrema superficialidade e pobreza, uma vez que permite uma navegação meteórica, dispersiva e ainda conta com a imbecilidade dos temas e da linguagem das redes sociais para liquidar a fatura. É a geração "Fast Thinker", que por falta de verdadeira formação torna-se também uma geração "Poor Thinker". A educação de base precisará mudar muito para evitar a imbecilização das próximas gerações pois, em breve, os examinandos do ENEM somente conseguirão escrever redações com 140 caracteres!

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  2. Vejo também, muitas vezes por parte de pais (preguiçosos ou massacrados pela rotina) que deixam de servir como modelo, como incentivadores do exercício da leitura de modo habitual; ou pelo menos ofertarem a leitura como atividade interessante e fundamental pra ter a vida salva (te parafraseando ... hehe)

    Gostei muito do blog, Eliseu ...
    e adorei a ideia de sugerir leituras (ou audições, nos bons Audiolivros, que me ajudaram a tornar proveitosa a rotina de viagens)

    tomara que esses novos formatos estimulem a curiosidade das pessoas por esse prazer !

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  3. Obrigado Roger !!! Vou tentar dar o melhor do que fiz com o melhor que recebi ! Espero lhe inspirar para um blog de música, visto que além da enorme paixão que você tem pelo tema, ainda tá virando artista !! (Já soube de sua incursão Cazuzesca !!! Iuhhhúú)

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  4. Citando um autor que admiro muito, cujas obras: O FISICO, XAMÃ, O ULTIMO JUDEU, A ESCOLHA DA DOUTORA COLE, Noah Gordon,ao meu ver é um dos melhores escritores de romances. Cada página lida, é de um enriquecimento enorme de detalhes que me remete ao local como personagem daquela estória.Como adoro escrever estórias também,admiro a forma desse autor que dá aos seus romances,uma magia própria que não encontrei em outros autores. São livros que poderiam virar filmes!

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    1. Verdade ! Também o acho um escritor de primeira linha e suas histórias não apenas são deliciosas de se ler, como muito informativas. Recentemente perdemos um autor semelhante, um grande contador de histórias associado a um pesquisador dedicado : Michel Chrichton, que além de médico, era roteirista e escritor de nada menos que "Jurassic Park", "O Grande Roubo do Trem", "Estado de Medo", "Sol Nascente", "Armadilha Aérea" entre outros. Em todos eles, além de gozarmos de uma ótima leitura, pois Michel era como Gordon, ainda temos oportunidade de aprender muito sobre ciência,cultura oriental, tecnologia e outros temas que ele e sua equipe pesquisavam diligentemente a cada novo livro.

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